O que até agora era bravata, “não é insulto, é o jeito dele”, “ele não é diplomata mesmo”, está a ponto de virar problema sério: a pedido da França, o G7, grupo dos países mais ricos do mundo, está reunido para ver o que faz com “a crise na Amazônia” – sem que ninguém se desse ao trabalho de avisar o país em que a queimada acontece, o Brasil. Tudo bem, os Estados Unidos (que tiveram gigantescos incêndios na Califórnia, com dezenas de mortos, sem que nenhum país europeu discutisse “o que fazer com a crise”) devem matar a bobagem, como maior economia do G7. Mas países europeus, cuja opinião pública está pronta para revidar as ofensas que Bolsonaro já lhes dirigiu, podem dificultar as importações do Brasil (e prejudicar o andamento do acordo União Europeia – Mercosul). Os agricultores franceses e alemães, que sobrevivem com altos subsídios, ficariam felizes. E é politicamente correto atingir um presidente cujas declarações públicas são tão inadequadas.
A última agressão, aliás, não é de Bolsonaro, mas de Eduardo, diplomata da família. Compartilhou no Twitter a mensagem “França em crise: Macron é um idiota”. A França é parceira do Brasil na construção de submarinos e de um reator nuclear destinado a produzir isótopos para remédios.
Pode ser que o G7 decida oferecer ao Brasil ajuda para combater o fogo. Mas depois que o presidente disse que não precisamos de doações europeias?
O fogo e o fato
Há queimadas e queimadas. Há as queimadas legais, em áreas agrícolas consolidadas, e queimadas ilegais, em áreas de preservação invadidas para formar fazendas, abrir caminho para garimpos, ou facilitar o transporte das árvores de boa madeira clandestinamente abatidas. Tereza Cristina, ministra da Agricultura, ligadíssima ao agronegócio, pediu a prisão dos incendiários. Mas, com as notícias que circulam na Europa, não será difícil colocar a culpa no agronegócio, que está fora disso, e afastar a competição brasileira.
O fogo de sempre
Já as queimadas legais – para tirar o mato que atrapalha o plantio – essas sempre ocorreram. Como ocorrem em canaviais não mecanizados, em que se bota fogo na plantação para permitir a colheita. Quem mora perto de canaviais sabe o que é a queimada. Suja tudo. É ruim, mas ainda essencial.
Em tempo
A situação não é tão péssima quanto se imagina, mas já é suficientemente ruim para nos preocuparmos. É tão ruim que até Bolsonaro já se mobiliza para enfrentá-la. Em vez de acusar as ONGs e os governadores adversários de tocar fogo na floresta, estuda medidas de emergência para circunscrever o incêndio e evitar que se propague ainda mais até que as chuvas o apaguem. A mobilização envolve Forças Armadas, Força Nacional e até colaboração com os governadores da região, por mais adversários que sejam. O incêndio não é o fim do mundo, mas é preocupante. Exige um esforço concentrado, com menos discursos, menos explicações e mais estudo, com ação imediata.
Moro, quem?
Desta vez Bolsonaro não se limitou a passar por cima de Sergio Moro, como em outras ocasiões, como quando jogou para o futuro o projeto anticrime que é a paixão do ministro da Justiça. Disse que não quer no cargo o diretor-geral da Polícia Federal e, se ele não pedir demissão nem for demitido por Moro, o ministro da área, ele mesmo o trocará. “Por lei, o diretor-geral é indicado por mim, não por Sérgio Moro”. Moro nada disse, como nada disse quando foi desautorizado outras vezes. O que se comenta é que ele ficará no Governo apesar de tudo, esperando que Bolsonaro assuma o ônus de demiti-lo – a ele, seu ministro mais popular.
O fato é que Bolsonaro prometeu a Moro, ao convidá-lo, total liberdade de ação, E ele acreditou.
Foi sem ter sido
Talvez Bolsonaro não se dê ao trabalho de demitir Sergio Moro, que tem popularidade e não cria problemas públicos, aceitando ser desautorizado sem romper o obsequioso silêncio a que se submete. E para que afastar do Governo um ministro que nunca chegou a fazer parte do Governo?
O nome do jogo
Bolsonaro só corre um risco: o de Sergio Moro se manter popular, mesmo depois de tudo o que vem passando. Pois aí vai virar candidato à Presidência.
O adversário
Quem se movimenta muito para ser candidato em 2022 é o governador de São Paulo, João Doria, PSDB. Vem fazendo críticas duras a Bolsonaro (a quem apoiou discretamente no primeiro turno e abertamente no segundo), mas mantendo certa elegância. O que se diz é que Doria aguarda a eleição do ano que vem, em que o apoio ou a omissão de Bolsonaro terão grande importância – em São Paulo, por exemplo, ambos podem apoiar a mesma candidata, Joice Hasselmann. Mas, passada a eleição municipal, João Doria abriria a mala de ferramentas e passaria a bater com mais dureza que o PT.
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