Publicado originalmente no Conjur, edição do dia 17 de fevereiro de 2015
Em tempos de delação premiada eu seu auge, uma história recente de Nova York relembra promotores americanos que esse instituto jurídico é tão bom quanto uma boa bebida: deve ser usado com moderação. Do contrário, desastres podem acontecer. Nessa história de assassinato, exames de DNA provaram a inocência de uma mulher, depois de ela passar 13 anos na prisão. E que o verdadeiro culpado era seu ex-namorado. No entanto, os promotores não puderam processá-lo, porque haviam garantido a ele imunidade, em troca de seu testemunho contra ela no julgamento.
A americana Lynn DeJac Peters fora acusada de estrangular a própria filha, Crystallynn Girard, de 13 anos, em sua casa em Buffalo, Nova York, no dia de São Valentim - o Dia dos Namorados - em 1993. Ela foi condenada em 1994 e inocentada em 2007, depois que exames de DNA revelaram que o assassino de sua filha era, na verdade, seu ex-namorado Dennis Donohue.
Exames feitos por um perito forense de slides e registros da autópsia da menina mostraram que a menina, além de estrangulada, fora estuprada. Nesse ponto, os promotores desistiram de recorrer contra a liberação de Lynn Peters e tiveram de encarar o fato de que não poderiam processar Donohue, porque haviam lhe garantido imunidade.
De qualquer forma, Donohue está na cadeia. Ele foi condenado, posteriormente, a 25 anos de prisão, por estuprar e estrangular outra mulher. Essa mulher foi a segunda vítima do acordo entre a Promotoria e o assassino.
Lynn Peters, por sua vez, não teve direito a visitas de seus filhos gêmeos, que nasceram um pouco antes do julgamento, nem da família, porque ela não entrou em acordo com a Promotoria antes do julgamento, pelo qual poderia admitir sua culpa em troca de uma condenação menor e outros privilégios. Ao contrário, ela manteve, durante todo o tempo, que era inocente.
Em 2009, o advogado de Lynn, Steven Cohen, entrou com uma ação indenizatória contra o Condado de Erie e a Cidade de Buffalo, alegando negligência nas investigações e no processo contra sua cliente, que resultaram em erro judicial. Em novembro de 2013, Lynn obteve na Justiça uma indenização de US$ 2,7 milhões, depois de fazer um acordo com a cidade de Buffalo e o estado de Nova York. Ela pedia mais de US$ 10 milhões, de acordo com o Huffington Post.
Lynn DeJac Peters não teve 13 anos para desfrutar a compensação pelo tempo que passou na prisão. Em junho de 2014, cerca de sete meses depois de receber a indenização, ela morreu de câncer. De acordo com o The Buffalo News, seus filhos gêmeos garantiram que ela morreu em paz, porque, na opinião dela, a Justiça tardou mas não falhou, afinal de contas.
João Ozorio de Melo - é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.