Foi uma espécie de experiência extrassensorial (não sei exatamente o que isso significa, mas é exótico o suficiente para ilustrar a ideia). Em frente à TV, vejo uma moça chamada de doleira (deve ser quem faz dólar) debochar de mim e mais milhões de brasileiros cantarolando e mostrando o traseiro (desculpe, os bolsos...); em outro canal, dava-se a notícia da lavagem de uma quantia enorme de dinheiro. A primeira imagem que me veio à mente foi a de um imenso varal com notas balançando ao vento, cada uma com seu prendedor de roupa, daqueles de madeira. Era assim lá em casa, quando a gente esquecia alguma nota no bolso da calça que ia para o tanque. Mas como não tem varal que chegue para tanta grana, devem estar falando de alguma coisa diferente. Qual será a porcentagem de espectadores (sejam de TV, rádio, internet, twitter etc) que têm ideia do que significa lavagem de dinheiro?
Dinheiro que, me informa outro telejornal, foi desviado da merenda escolar pelo prefeito de uma cidade no Tocantins. Regra básica: quem desvia dinheiro de criancinha deveria ficar na cadeia por todo o sempre, e a chave jogada fora, só para garantir. O tal prefeito, que estava sendo gravado sem saber (mais um hit da estação) comentou que a empresa co-locupletora estava mesmo oferecendo uma porcaria para as crianças, tanto que algumas até passaram mal. Então imagine: você manda seu filho pequeno para a escola; ele chega em casa doente porque comeu o que lhe foi servido pela Prefeitura, e o que a Prefeitura serviu estava estragado não por um descuido ocasional, mas como resultado da corrupção de um prefeito de meia tigela. Zap já!
Corrupção é assunto também no outro jornal, que mostra caciques querendo comprar indulgências via devolução do (ou parte do) dinheiro que desviaram. É o tal do morde e assopra, tira muito, devolve um pouco e espera boa vontade dos lesados. (Aliás, qual a diferença entre desviar e roubar?)
E aí aconteceu a experiência extrassensorial: à medida que ouvia essas notícias, parecia que eu ia diminuindo de tamanho, encolhendo, que o sofá estava ficando cada vez maior.
Era a deixa para a entrada de algum super herói, mas nada aconteceu. Cadê o Robin Hood? O último que se considerava o guru de Sherwood provou que, depois de velho, havia se transformado no que o bruxo Brizola previra há décadas: um sapo barbudo. E não tem nenhuma princesa no pedaço disposta a tentar a transformação. A não ser alguma amiga da Val Marchiori ou da nova esposa loira de algum publicitário. Não, deixa assim mesmo - e tomara que ele encontre um brejo bem longínquo para curtir sua aposentadoria.
Renan e Cunha na tela ao mesmo tempo. É muito pixel para mim, vou acabar sumindo ali no sofá, já estou menor que a almofada...
FHC em New York recebendo homenagens (típico), Serra foi apoiar.
Nada de salvamento à vista.
Nem os dois gols do Neymar, meu maior herói nesses tempos de vacas magras e craques parcos, conseguiram impedir que eu fosse diminuindo, diminuindo.
Já ia perdendo toda a esperança quando ouvi uma estrondosa gargalhada. Parecia vir do andar de cima. Mas vinha mesmo é do céu.
Gargalha que gargalha, eu fui crescendo! Que alívio. Saí no terraço e olhei para cima: lá no céu estavam, rindo a valer, olhando para mim, o JK, o Ulysses, o Getúlio, o Tancredo, o Brossard, o Darcy e mais alguns que eu não consegui reconhecer.
Acho que o D. Pedro II era um deles.
*Sílvia Zaclis - É jornalista