Artigo publicado originalmente em O GLOBO, edição de 7 de agosto de 2015
Tenho pena do Zé Dirceu. Mesmo. De verdade. Assim como tenho pena do Collor, também. E tenho pena porque não consigo imaginar o que é uma falta de ambição desse tamanho, ou, por outra, uma ambição tão descomunal, mas com tal defeito de fábrica.
Collor, por exemplo, que só não está preso por descuido. Foi o presidente mais jovem jamais eleito no Brasil, e tinha apoio suficiente da população para mandar os chantagistas habituais do Congresso às favas. O que é que uma pessoa verdadeiramente ambiciosa faria nessa situação? Faria o melhor governo possível, lutaria com unhas e dentes para melhorar o país e deixar uma marca positiva e indelével na História. Teria tido tempo suficiente para isso, e ainda teria vida sobrando.
Em vez disso, preferiu comprar meia dúzia de carros importados.
Para isso, ele não precisava se eleger presidente, bastava abrir uma concessionária.
Zé Dirceu, a mesma coisa. Partiu para uma vida dramática, lutou pelos seus ideais (sim, Millôr, é verdade, precisamos desconfiar dos idealistas que lucram com os seus ideais), dedicou-se à construção de um grande partido, se bom ou mau são outros quinhentos.
Poderia ter chegado à Presidência. E, como Collor, poderia ter feito uma grande diferença para o bem; instrumentos não lhe faltaram.
Em vez disso, preferiu enriquecer.
Para que mesmo?
Para andar de jatinho?
Para fazer implante?
Para usar calção Villebrequin?
Que pobreza.
(Sim, sim, pena mesmo, de verdade, eu tenho é do Brasil e da sua gente; mas todo ser humano tem penas de vários tipos em estoque, e pode usá-las todas simultaneamente sem prejuízo umas das outras...)
Cora Rónai - Jornalista, escritora e fotógrafa. Especializada em tecnologia