Publicado originalmente no Blog Balaio, de Ricardo Kotscho, post de 24 de setembro de 2015 - http://noticias.r7.com/blogs/ricardo-kotscho/
"Ao governo, cabe abandonar o mantra obsessivo de mais e piores impostos e operar uma reforma profunda do Estado, reduzindo Ministérios, cargos comissionados, e revendo contratos. Agora é a hora da verdade. O governo não cabe mais no PIB brasileiro e precisa reavaliar todos os seus programas e conferir prioridade aos que devem ser mantidos".
Perfeito esse diagnóstico. Assino embaixo. Precisamos mesmo rediscutir urgentemente o tamanho do Estado Brasileiro e promover uma reforma de cabo a rabo, em lugar de ficar discutindo no varejo cortes de despesas e aumentos de impostos para fechar as contas públicas.
E vocês sabem quem é o autor da frase acima? Por incrível que possa parecer, é o presidente do Senado, Renan Calheiros, um dos mais emblemáticos representantes do patrimonialismo cevado pelas oligarquias desde os tempos do Império, e de tudo que existe de mais atrasado na política brasileira, cuja melhor expressão partidária é o PMDB, o verdadeiro dono do poder desde a redemocratização do País.
Poderíamos começar cortando pela metade o número de ministros, deputados, senadores, vereadores e desembargadores, juntamente com todo o respectivo séquito de motoristas, assessores, servidores de cafezinhos, além de acabar com todas as imensas frotas de aviões e carros oficiais e apartamentos funcionais custeados pelo Estado, ou seja, por todos nós.
A despesa pública com esta farra de mordomias dos exércitos de excelências, por consequência, iria, de cara, cair pela metade _ e não iria mudar nada nas nossas vidas, ninguém iria nem perceber, não fariam a menor falta. Ao contrário, sobraria dinheiro para custear saúde, educação e infraestrutura, os grandes gargalos nacionais, cada vez mais ameaçados pelos cortes de recursos. E não seria preciso criar nem aumentar nenhum imposto.
Um dos mais aberrantes exemplos de como os cofres públicos são sangrados sem dó nem piedade, e sem que a maioria da população saiba disso, é o pagamento de pensões vitalícias a filhas de militares. De acordo com os números da "Avaliação Atuarial das Pensões dos Militares" enviados pelo Ministério da Defesa à Comissão de Orçamento, e revelados esta semana por reportagem publicada no jornal O Globo, há ainda 185.326 beneficiárias deste injustificável privilégio concedido às Forças Armadas.
Embora extinto há 15 anos para servidores admitidos depois da mudança na legislação, o benefício continua sendo pago para as filhas dos militares que já integravam as Forças Armadas. Este contingente de filhas de militares representa hoje 27,7% do total de pensionistas das três Forças e 36,25% do efetivo de militares.
Sabem quanto este privilégio, que sobrevive a todos os regimes e governos, custará ao País em 2015? A módica quantia de R$ 3,8 bilhões, a serem pagos por um regime de aposentadoria deficitário, que apresenta um rombo projetado em R$ 11 bilhões para este ano, como informam as repórteres Geralda Doca e Letícia Fernandes. É por isso que as nossas contas nunca fecham e os buracos só aumentam no Tesouro Nacional, provocando a perda do grau de investimento, a disparada do dólar, dos juros e do desemprego.
Está aí apenas uma das razões pelas quais ninguém quer mexer com esta história de reforma do Estado. Quais são as lideranças que temos hoje, quais são os partidos políticos com coragem para liderar este movimento num País que é um dos poucos do mundo onde o regime geral da Previdência Social prevê o pagamento integral (igual ao valor recebido pelo segurado enquanto vivo) da pensão aos herdeiros dos servidores públicos?
A reportagem de O Globo lembra que, "no ajuste fiscal do começo do ano, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, tentou mudar a fórmula de cálculo. O valor cairia pela metade, mais 10% por dependente, incluindo o viúvo ou viúva. No entanto, o próprio relator da medida provisória, deputado Carlos Zarattini (PT-SP), mudou o texto proposto pelo governo e reduziu a economia prevista".
**Ricardo Kotscho é jornalista. Trabalhou nos principais veículos da imprensa brasileira como repórter, editor, chefe de reportagem e diretor de redação. Foi correspondente na Europa nos anos 70 e Secretário de Imprensa e Divulgação da Presidência da República no governo Luiz Inácio Lula da Silva. Ganhou os prêmios Esso, Herzog, Carlito Maia e Cláudio Abramo, entre outros.