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O preço da verdade. Por Carlos Brickmann

... nos bons jornais e revistas, a notícia é não apenas completa, mas confirmada. Notícia fria, abundante na internet e nas redes sociais, não entra. Quem paga pela informação tem garantia de qualidade, está melhor informado do que os que preferem notícia grátis...

23.02.2016  |  98 visualizações
Artigo publicado originalmente na edição de hoje, 23 de fevereiro de 2016, na Folha de S. Paulo, Tendências/Debates, página 3



Foi nesta Folha, em 22 de novembro de 1963, dia da morte do presidente Kennedy. O jornal recebia o noticiário internacional por dois teletipos, da UPI e da AFP (agências de notícias internacionais). Os dois deram defeito e, enquanto Kennedy era o assunto do mundo, nós na Folha, alheios ao caso, fazíamos uma edição normal.

Ao saber da notícia (informados, veja só, por minha mãe), conseguimos botar na rua uma edição extra. A equipe, chefiada pelo Woile Guimarães, era ótima. Deu para salvar o dia. Naquele tempo, não tão distante, a notícia era rara e cara.

O "Repórter Esso", principal noticioso da TV, recebia filmes da UPI por avião, uns dois ou três dias depois dos fatos. Boa parte das rádios lia as notícias do jornal.

Hoje a notícia é abundante, instantânea, barata. Podemos acompanhá-la, assistir ao vídeo, ler (e fazer) comentários. Tudo de graça.

... "Por um motivo básico: nos bons jornais e revistas, a notícia é não apenas completa, mas confirmada. Notícia fria, abundante na internet e nas redes sociais, não entra. Quem paga pela informação tem garantia de qualidade, está melhor informado do que os que preferem notícia grátis"...


"Playboy" para quê? Na internet tem mulher famosa nua e filme pornô. Tudo grátis. Por que devemos pagar, então, para ler um jornal ou uma revista?

Por um motivo básico: nos bons jornais e revistas, a notícia é não apenas completa, mas confirmada. Notícia fria, abundante na internet e nas redes sociais, não entra. Quem paga pela informação tem garantia de qualidade, está melhor informado do que os que preferem notícia grátis.

Por isso, quando a revista "Exame", de ótima reputação, premiou a Samarco, em julho de 2015, como melhor mineradora do Brasil (seu quinto prêmio, o terceiro consecutivo), deveríamos confiar em seu critério.

Mas, em novembro, rompeu-se a barragem da Samarco em Mariana, destruiu-se o rio Doce e desde então não param de pingar notícias sobre as más práticas da mineradora.

Segundo a "Exame", o prêmio é dado após análise de informações completas. Não foi bem assim. Olhou-se apenas a questão do lucro. A segurança, como diria o imortal personagem Justo Veríssimo, era apenas um detalhe.

De quem era o avião em que morreu o candidato Eduardo Campos? Apenas para comparação: quando secou uma das represas do sistema Cantareira, descobriu-se que existia lá uma carcaça de automóvel. Em dois dias divulgou-se quem era o dono. Por que então o proprietário de um avião, sujeito a controles muito mais rígidos, permanece oculto?

... O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, plantou dezenas de pequenos postes destampados, do calibre de uma lata de cerveja, cercando ciclovias. Acumulam água e hospedam mosquitos. E a grande imprensa, mesmo com o "dengódromo" diante dos olhos, silenciou ...


Como dizia um grande especialista em jornal, Octavio Frias de Oliveira, publisher da Folha, merece o máximo esforço sua excelência, o leitor. Ninguém compra um jornal para ter as mesmas informações que teria de graça na internet. Aliás, e o corte de oito ministérios? Morreu?

Por que os grandes jornais e revistas ainda não descobriram os proprietários do avião? Pior: por que estarão esses proprietários guardando tão ciosamente seu segredo? Segredo por quê?

Essa sim é a notícia.

O mosquito Aedes aegypti foi erradicado, voltou, falou-se da dengue, mas chikungunya e zika surgiram de repente. A imprensa soube junto com seus clientes, não antes.

O prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, plantou dezenas de pequenos postes destampados, do calibre de uma lata de cerveja, cercando ciclovias. Acumulam água e hospedam mosquitos. E a grande imprensa, mesmo com o "dengódromo" diante dos olhos, silenciou.

Não podemos reclamar da queda de circulação de jornais e revistas. Em parte é a destruição criativa, a substituição de um modelo por outro. Todavia, muito mais do que isso, é o suicídio de cobrar por algo que não se entrega.

CARLOS BRICKMANN, 71, é diretor da Brickmann & Associados Comunicação e editor do site www.chumbogordo.com.br. Foi editor de internacional da Folha

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