Coluna - Observatório da Imprensa
Dilma foi muito bem no debate. Só estava irritada porque o jornalista José Paulo de Andrade foi agressivo com ela. Marina deu show no Jornal Nacional: se pareceu mandona, é porque o jornalista William Bonner insistiu em interromper suas frases, pedindo-lhe que deixasse as elucubrações de lado e respondesse às perguntas. Aécio estava maravilhoso na Globo, tinha respostas para todos os problemas nacionais, mas essa mania de ficar perguntando do aeroporto inibiu seu raciocínio e impediu que maravilhasse o país com seu programa. Que programa? Pronto: outro jornalista chato, que com toda a certeza estava a serviço dos adversários, querendo saber de coisas que o marqueteiro não tinha programado e portanto nem deviam ser lembradas.
Até aí, tudo bem: o choro é livre. Houve quem considerasse que aquele fato banal em qualquer democracia do mundo, uma entrevista, era um duelo entre os jornalistas e o político, em que haveria forçosamente um vencedor. Houve comentários dos jornalistas que trabalham profissionalmente em redes sociais a respeito do massacre sofrido pelos entrevistadores, amplamente derrotados nas entrevistas e que deveriam voltar humilhados para casa (houve também quem sugerisse que, em virtude da insistência em perguntar o que o público queria saber, deveriam ser demitidos imediatamente).
Esclarecer o eleitorado? Besteira: o eleitor já sabe quão maravilhoso é o candidato, ou candidata. E, se não souber, este ser não-engajado não passa de uma besta, que não merece ser levada em conta por adeptos de candidatos tão ótimos.
Ruim, não? E imensa é a quantidade de jornalistas que imagina que entrevista, especialmente em época de eleições, é duelo, não um diálogo que, embora possa ser duro, deve ser necessariamente respeitoso, de ambos os lados; e cujo objetivo não é agradar a torcida de seu time, nem as torcidas dos outros candidatos, nem encher páginas e mais páginas de jornal, nem preencher tempo de TV e rádio. O único objetivo das entrevistas é esclarecer o que é obscuro. Se este objetivo não for alcançado, a entrevista terá sido um fracasso.
Parece futebol: o mesmo torcedor, vendo um lance, varia sua interpretação conforme o time beneficiado. Aquilo que de um lado é mão na bola e, certamente, pênalti, é apenas bola na mão quando acontece do outro lado (e, claro, o lance ocorreu fora da área). O juiz nunca se engana: sempre rouba. E sempre rouba em benefício do time adversário. É o apito inimigo - que, se dá discussões até divertidas em futebol (permitindo ironizar o torcedor adversário com frases como "foi de mão, sim, e você nem percebeu que havia impedimento", "roubado é mais gostoso", ou, na imortal definição de Maradona, com a intervenção de "la mano de Dios"), em eleições cria problemas difíceis, já que traz embutida a intenção de desgastar a democracia sempre que os adversários tiverem mais votos.
Em última instância, golpismo. É disso que se trata. E, se não mudarmos a visão futebolística da política, esta visão pobre e reducionista do nós contra eles, um dia isso infelizmente vai dar certo.
Vale tudo
Sim, o vídeo é verdadeiro. Mas é fraudado. E, embora seja evidentemente fraudado, continua na Internet, como se limpo fosse. Porque o importante no caso é confundir, não esclarecer.
Então, esclareçamos. Há um vídeo amplamente difundido na Internet em que o ex-presidente Lula faz fartíssimos elogios a Marina, mulher de peregrinas virtudes, notável, magnífica, inigualável. Epa: Marina? Sim, é Marina - só que, olhando-se o vídeo com um pouquinho de atenção, verifica-se que é candidata em Goiás. Trata-se de Marina Santana, que disputa o Senado pelo PT goiano. Mas Lula jamais a chama pelo nome completo (ou, se a chamou, a fraude é mais grave, porque isso foi apagado no vídeo que está no ar): é só Marina.
Alguém pegou o vídeo, incluiu o logo da candidatura presidencial de Marina Silva no início e no fim, e distribuiu-o pela Internet. É óbvio, para qualquer eleitor mais bem informado, que Lula não faria propaganda de uma adversária de Dilma (a menos que tivesse rompido com a presidente, o que teria ocupado o noticiário político por vários dias). Mas acontece que nem todo eleitor é bem informado. E a boataria se espalha pelas redes sociais.
O PT já pediu a retirada do vídeo, a campanha de Marina Silva negou qualquer responsabilidade por seu uso indevido (e adulteração, já que os logos nele inscritos modificam seu significado), e algum dia, imaginemos que antes das eleições, saberemos quem é o responsável pelo golpe baixo. Este colunista está convencido de que alguém será descoberto; e esse alguém, logicamente, terá agido sozinho, por puro fervor ideológico, sem qualquer ligação com qualquer candidato. Será, sem dúvida, uma pessoa humilde, com emprego modesto (emprego do qual será demitido com desonra, o que lhe acarretará inúmeros problemas para conseguir outro).
Dos chefões das campanhas, nenhum, certamente, se prestaria a manobra tão desleal.
Boa notícia
A Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo, Abraji, acaba de tomar uma excelente iniciativa: criou um portal público, Eleição Transparente, que funciona como banco de dados de pedidos judiciais de remoção de conteúdos, seja qual for o veículo. Os meios de comunicação terão enorme facilidade em acompanhar esses pedidos, separando o que é legítimo do que é apenas tentativa de censura. Pelo portal, é possível procurar por candidato, partido, Estado ou empresas notificadas para retirar algo da imprensa ou da Internet.
Tudo o que contribui para deixar claro aquilo que acontece é bom - esse portal, por exemplo.
E podia?
A Justiça Federal acaba de proibir, por medida liminar, que um fabricante de bebidas coloque carga com peso excessivo em seus caminhões. A liminar foi pedida pelo Ministério Público Federal. O alvo da liminar foi a Cia. Muller de Bebidas (caninha 51 e outras).
A notícia passou quase despercebida. Mas tem aspectos interessantíssimos que, se os meios de comunicação estivessem atentos aos interesses de seu público, abririam caminho para dezenas de excelentes pautas. Por exemplo: até agora, apesar das balanças nas estradas, apesar da regulamentação pelos órgãos técnicos do peso máximo permissível por eixo, apesar da presença da Polícia Rodoviária, os caminhões podiam trafegar com excesso de carga? Pois, se não pudessem, a liminar nem seria necessária. E, se podiam, para que servia o aparato de regulamentações e fiscalizações, exceto para desperdiçar dinheiro público?
Outra: ao produzir um caminhão, a fábrica calcula seus componentes para atender a determinados padrões de desempenho. O molejo e os amortecedores devem ser capazes de suportar x toneladas, os pneus y toneladas; os freios devem ser capazes de conter aquele mamute sobre rodas em tantos metros, dependendo da velocidade daquele momento. Se o peso é superior ao previsto pelas fábricas, os freios não têm o mesmo desempenho, molas e amortecedores podem ceder e fazer o caminhão arriar - ou até desabar em cima de outros veículos - os pneus, em determinados trechos, podem explodir. Quem é que permitia que os padrões de fábrica fossem violados numa boa?
Há mais, muito mais. As rodovias são planejadas para determinado peso. Se o peso excede sua capacidade, a rodovia cede, os buracos aparecem antes da hora, torna-se impossível executar a manutenção preventiva - impossível, caro e inútil, já que um leito de estrada não é capaz de suportar pesos maiores que os planejados. E quem é que paga o conserto das estradas? Claro: aquele cavalheiro que o caro leitor vê ao espelho, de manhã, no momento de fazer a barba.
Quanto à fabricante da caninha 51, foi autuada 350 vezes pelo mesmo motivo em três anos. Não há erro, portanto: há a intenção deliberada de ignorar a lei.
Boas pautas, não? E, se a imprensa quiser avançar um pouco mais, uma empresa de transporte de sucos costuma carregar quase a capacidade máxima do caminhão na fábrica, deixando pouquíssimo diesel nos tanques. Passa então pela balança e é aprovada. Poucas centenas de metros à frente, há o posto onde enche os tanques de diesel. E trafega com excesso de peso até o destino.
Como...
Num jornal impresso de circulação nacional, o point surfístico de Teahupoo, no Taiti, é chamado de "praia".
Tudo bem, é mar, e com ondas gigantescas, violentíssimas; mas praia só daqui a alguns milhares de anos, quando as rochas, de tanto apanhar das ondas, forem aos poucos virando pedriscos.
...é...
De um grande portal noticioso da Internet, noticiando o casamento de um sobrevivente do atentado da maratona de Boston com a enfermeira que cuidou dele: