Coluna - Observatório da Imprensa
A Rede Globo, como todos sabem, é totalmente contrária ao PT. E totalmente favorável ao PT, também - como a Folha de S.Paulo e todos os demais órgãos da imprensa, com exceção daqueles que, pagos, são absolutamente partidários, em nenhuma possível margem de dúvida. Nunca a notícia é ruim porque os fatos são ruins, nunca as coisas vão mal, nunca a pesquisa indica que nossos candidatos perdem substância ou que os adversários ganham corpo. Não: as pesquisas são manipuladas porque, "como todos sabem", o partido adversário encomenda e paga aquilo que é mais conveniente para defender seus interesses escusos.
Os fatos que se danem: embora a imprensa erre, e muito, a porcentagem de acertos é muito maior. Basta analisar seu conteúdo. O consumidor de informações não é burro: se as notícias pelas quais paga forem sistematicamente equivocadas, por que continuaria a pagá-las? Não faz mal: os fanáticos dos diversos setores continuarão a montar gigantescas teorias a respeito da conspiração universal contra seus cândidos, puros e irretocáveis interesses, cujo objetivo é o bem comum. Se a pesquisa mostra um candidato subindo, é falsa para alguns, irretorquível para outros. Ninguém imagina a possibilidade de que, embora ruim para seus candidatos, a pesquisa seja efetivamente um retrato do momento.
Até aí, tudo bem; mais difícil é quando líderes, pessoas responsáveis, adotam, por ignorância ou interesse, as mesmas posições conspiratórias.
Não faz muito tempo, a presidente Dilma Rousseff disse que a imprensa tem é de divulgar, não investigar. OK, esse tipo de pensamento pode até favorecê-la politicamente num determinado momento. Mas a longo prazo, caso seja sua intenção fazer um Governo eficiente e transparente, uma imprensa investigativa é essencial. Se um Governo quer fazer o máximo com o mínimo possível de recursos, a melhor maneira de fiscalizar seus executivos é tê-los na mira da imprensa (é claro que, se o objetivo não for esse, a imprensa vai atrapalhar e muito).
O ex-presidente Lula, com o objetivo de impulsionar a candidatura à reeleição do governador gaúcho Tarso Genro (que, nas pesquisas, luta para superar a jornalista e senadora Ana Amélia, do PP que apoia Aécio), disse que jornalista não funciona em cargo executivo. Justamente ele, que levou Miguel Jorge, Édison Lobão e Hélio Costa para seu Ministério; justo ele, que apoiou Hélio Costa para o Governo de Minas, que lançou Eduardo Suplicy para a Prefeitura e o Governo de São Paulo, que apoia o dono de jornal Henrique Alves para o Governo do Rio Grande do Norte. Ao mesmo tempo, é Lula que dá corda a Franklin Martins e seus seguidores, que querem implantar no Brasil uma censura à imprensa igual à da Argentina e da Venezuela - censura econômica, comercial, que envolva boicote de anunciantes que devem favores ao Governo e dificuldades aos veículos menos colaborativos para conseguir papel e outras matérias-primas essenciais.
Só o PT é assim? Não: a PM do governador tucano Geraldo Alckmin, em São Paulo, usou suas balas de borracha no rosto de jornalistas, cegando um, machucando seriamente outra - e os jornalistas estavam perfeitamente identificados, podendo ser reconhecidos de longe. O candidato Aécio Neves, do PSDB, mal colocado nas pesquisas, deveria ter o maior interesse em conseguir boa-vontade e espaço nos meios de comunicação. No entanto, permitiu que seus seguranças agredissem o repórter fotográfico da Associated Press, André Penner, durante uma visita a Taboão da Serra, SP.
E não foi nada acidental, não: Penner foi cercado por três seguranças e agredido com chutes e socos na cabeça. A câmera desapareceu (que terá fotografado, para valer a pena tanta violência?) Pedaços de equipamentos ficaram espalhados pela rua. Ao lado de Aécio, estavam o governador Geraldo Alckmin e candidatos a deputado estadual e federal. Algum interveio? Não.
De alguma forma, todos os lados da disputa concluíram que têm um inimigo comum, os meios de comunicação. E disso só se pode tirar uma conclusão: se eles acham que os meios de comunicação efetivamente são seus inimigos, também reconhecem, ao mesmo tempo, que têm motivos para tê-los como inimigos e temê-los. E o eleitor tem excelentes motivos para escolher outros candidatos menos suspeitos.
Crime de opinião
A cena era dramática: um garoto, menor de idade, foi subjugado enquanto promovia assaltos. Puseram-no nu, amarrado num poste, e ali o abandonaram.
Barbárie pura, claro; mas a apresentadora Raquel Sheherazade disse, no ar, que entendia as razões de quem amarrou o "dimenó". Cansados da falta de segurança, cansados da falta de alguém a quem recorrer, alguns moradores se vingaram amarrando o agressor. Não estavam certos, praticavam uma violência desmedida, mas na exasperação do momento fizeram o que lhes deu na cabeça. E Raquel Sheherazade disse que os entendeu. Este colunista não concorda com Raquel, mas também não concorda com as tentativas de patrulhamento e judicialização para impedi-la de ter opinião própria. Raquel Sheherazade está sujeita a punição muito maior do que a que tentam lhe impor: se o público chegar à conclusão de que ela não merece ser vista, ela irá simplesmente desaparecer das telas de TV.
Pois não é que agora querem enquadrá-la como criminosa? O garoto que assaltava não é criminoso, o pessoal que o amarrou não é criminoso, e ela, que nem estava no local e se limitou a dar sua opinião sobre o caso, é a única acusada.
Segundo o Ministério Público Federal, a jornalista, ao comentar o caso, "violou o princípio da dignidade humana e direitos da criança e do adolescente, além de estimular a tortura e a justiça com as próprias mãos".
OK: se não fizessem a justiça com as próprias mãos, as vítimas do assalto iriam recorrer a quem, para que a justiça fosse feita? Como poderiam conter o rapaz sem entregá-lo à Polícia - e Polícia não havia?
Outro dia, pai e filho foram assaltados por dois bandidos armados. Reagiram, e um dos bandidos foi morto. O pai, 76 anos, foi preso e dormiu na cadeia (no dia seguinte, alguém de bom senso concluiu que a prisão era indevida). O filho, ferido, foi levado ao hospital sob escolta. A quem poderiam recorrer, para que justiça fosse feita?
E que é que o Ministério Público pede? Que a emissora obrigue a jornalista a se retratar de sua opinião, sob pena de multa de R$ 500 mil por dia de demora. Antigamente quem fazia esse trabalho era a dra. Solange. Não havia multa, mas a emissora podia ser suspensa. Não falta muito para voltarmos a esse estágio.
Que Escurinho, que nada!
Em nota sobre insultos racistas de parte da torcida do Grêmio, este colunista citou o atacante Escurinho como um dos ídolos negros do time. Erro total (e que provocou uma série enorme de correções de leitores): Escurinho jogou no Internacional de Porto Alegre, maior rival do Grêmio. O jogador negro que fez mais sucesso no Grêmio foi Everaldo, que chegou à Seleção brasileira e foi campeão do mundo em 1970. Pela conquista -o primeiro atleta gaúcho, jogando num time gaúcho, a ganhar o Campeonato do Mundo pela Seleção brasileira - Everaldo foi homenageado com uma estrela dourada na bandeira do Grêmio.
Agora, um segredo: este colunista, vez por outra, comete deliberadamente esse tipo de erro, apenas para avaliar a atenção com que é lido.
Agora, outro segredo: a frase acima foi sugerida por festejado redator de discursos, especializado em explicar que o que foi dito não é exatamente aquilo.
Abaixo os números!
Uma parte considerável dos jornalistas (não todos: no máximo, 99,755%) aproximou-se da profissão depois de descobrir que não sabia tratar com números. Mas tudo bem: o importante não é saber lidar com os números, é ter o número de telefone de quem saiba.
O problema é que muitos profissionais esquecem esse princípio básico: se não sabemos, vamos consultar quem sabe. E aí saem coisas primorosas: